Há um tempo venho percebendo um problema naquela frase tão comum nas conversas de pais e educadores: “No meu tempo as crianças não eram assim. Só um olhar do meu pai era o suficiente para a gente ficar quieto”.
No meu tempo… Nós gostamos de pensar que no nosso tempo tudo era diferente e que no nosso tempo as coisas – ou a maioria delas – funcionava como deveria ser. O que nem sempre é verdade, claro. Nós temos uma forte tendência de lembrar do o passado em tons mais dourados do que realmente foi e para o presente em tons mais escuros do que realmente é.
A questão que me fez pensar foi: será que as crianças mudaram mesmo?
Então eu resolvi fazer uma experiência e fazer o teste com meus alunos. Não só para descobrir essa resposta, mas porque chegou uma hora em que eu cansei de falar cada vez mais alto e não ser ouvida, especialmente porque eu tenho o grave problema de não conseguir falar para um grupo se alguém está conversando. Então decidi parar e olhar.
No começo não mudou muita coisa. Naqueles momentos de bagunça generalizada não fazia muita diferença se eu estava escrevendo nas agendas ou olhando para eles. Então eu entendi que precisava mudar o olhar. Percebi que meu olhar precisava transmitir de forma clara a mensagem “eu tenho algo a dizer e não vou fazer isso enquanto vocês não estiverem em silêncio”.
Foi então que, para minha surpresa, comecei a perceber duas reações. Uma eram as vozes que começavam a ecoar aqui e ali: “a professora quer falar!!”. A segunda é que conforme as conversas iam parando e cada um voltava ao seu lugar, aqueles que ainda estavam falando percebiam que eu estava olhando para eles e se encolhiam dizendo “desculpa, prô”.
Fantástico! Sem gritar, sem fazer ameaças, sem ficar rouca, sem “perder a linha” – porque cada vez que eu precisava gritar mais alto para ser ouvida sentia toda a minha autoridade indo por água abaixo.
Foi então que eu entendi que as crianças não mudaram. Elas não deixaram de entender e acatar o significado do olhar. Fomos nós, os educadores, que paramos de olhar e começamos a falar demais.
Talvez por estar muito ocupados com muitas atividades e não querer perder tempo… É muito mais fácil gritar “Juquinha, volta já para o seu lugar!!” – enquanto procuro a atividade que estava aqui agora mesmo e acabou de sumir – do que parar tudo e ficar em pé na frente da mesa olhando para eles. Porque todos nós – pais e professores – estamos sempre muito ocupados.
Mas o olhar faz uma grande diferença. Quando eu olho com atenção eu não transmito apenas a mensagem “façam silêncio porque eu quero falar”. Embora seja isso mesmo o que eu quero dizer, eles estão lendo, nas entrelinhas, uma outra mensagem. Eles estão ouvindo: “Eu estou olhando para você. Eu estou prestando atenção no que você está fazendo e dizendo. Eu me importo com você e vou aguardar sua atenção.”
E desde então eu tenho descoberto grandes coisas. Descobri que não são só os apaixonados e os grandes amigos que se comunicam pelo olhar, mas todos aqueles que se conhecem e tem alguma cumplicidade. Descobri que os alunos aprendem a conhecer meus olhares assim como eu aprendo a conhecer os olhar de cada um deles.
Uma resposta para “A importância do olhar”
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