Certa vez, em uma reunião de professores no início do ano, a coordenadora pediu que nós escrevêssemos qual nosso maior alvo para aquele ano. E eu escrevi: “Trabalhar em paz”.
Depois eu achei engraçado porque pensei que isso deve ter parecido ideia de uma pessoa preguiçosa, que quer viver “numa boa” e sem ter trabalho, mas era exatamente o oposto disso! Sinceramente, ensinar e educar são coisas que dão muito trabalho e exigem muito empenho (como tudo na vida que valha a pena), mas sentir cansaço pelo esforço e dificuldade não é o mesmo que viver angustiado.
E a questão é que eu preciso de paz para ser uma boa professora. Por duas razões.
Primeiro porque eu preciso investir na minha própria formação – ou seja, preciso ler, pesquisar, estudar. E eu realmente não consigo fazer isso quando estou correndo atrás de atividades e mais atividades para fazer com as crianças – que, por sua vez, geram pilhas e pilhas de lições para corrigir, porque todo exercício que a criança faz precisa, pela lógica, ser avaliado – e todas as outras atividades de planejamento, reuniões, ensaios, recorta, cola, monta, faz e acontece, sem contar as demais áreas da vida que exigem nosso tempo e energia.
Sobre esse ponto, gostaria de dizer que sempre achei estranho como as pessoas costumam identificar um professor por suas habilidades manuais. “Ah, você é professora, então deve saber fazer cartaz!”. Não sei bem de onde vem esse pensamento de que ser professor é viver criando materiais, mas na verdade considero muito contraproducente que professores invistam tanto em atividades que os mantêm ocupados, e com isso não lhes sobre tempo nem ânimo para sequer abrir um livro e estudar (se eu, que amo estudar, quando estou sobrecarregada não tenho ânimo para isso, imagino aqueles para quem o estudo em si já é um desafio). Não que os trabalhos manuais e as aulas diferentes sejam um problema (eu mesma gosto de fazer isso), mas creio que não deveria ser esse tipo de atividade que mais ocupa o tempo de um professor, nem o que o caracteriza, porque os recursos e materiais são uma parte muito pequena do trabalho de ensinar. Meu pensamento sobre isso é que quem tem uma boa formação pode ensinar usando o que tem nas mãos. Assim, ao invés de viver preparando aulas, a pessoa vive preparando a si mesma para que toda situação seja uma oportunidade para uma boa aula, deixando depois que o aluno faça a sua parte ao escrever ou registrar, de alguma forma, o aprendizado.
Mas eu disse que tinha duas razões para querer trabalhar em paz. E a segunda delas é que quando uma pessoa está sobrecarregada de atividades, inevitavelmente ela se sente irritada e impaciente, como qualquer pessoa estressada. E o problema é que para ensinar bem é preciso ESTAR bem. Para explicar tranquilamente, para ouvir com atenção, para sentar do lado, para mostrar onde está o erro e como corrigir, para se relacionar de forma tranquila com aquele a quem eu pretendo ensinar… Para tudo isso é preciso estar com as emoções no lugar certo; é preciso estar em paz. Mas quando você precisa lidar com uma demanda absurda de responsabilidades, de exigências vindas de todos os lados e de todas as expectativas que decidiu atender, como você vai conseguir ficar calma? Uma pessoa mais reservada pode até não surtar nem gritar, mas por dentro ela ficará fervendo e uma hora adoecerá.
“Pois é. Esse é um problema das escolas mesmo” – alguns dirão.
E eu direi o que sempre digo: esse é um problema da nossa vida atual. A escola é só um reflexo disso. Porque se você reparar bem, esse “ativismo” está presente em todo canto. Nas empresas, nas igrejas e até nas famílias. É essa sensação de que quanto mais fizer, melhor. Como se o fato de estarmos sempre muito ocupados mostrasse que estamos sendo produtivos – o que na verdade é um engano.
Para ser produtivo é preciso ter foco. É preciso fazer uma coisa de cada vez. (Sim, mesmo as mulheres, que têm a fama de conseguir fazer muitas coisas ao mesmo tempo, e mesmo para as crianças e adolescentes que acham que são da “geração multitarefas”). E é preciso buscar formas mais simples de lidar com a vida. Como professora, creio que ao invés de estar sempre em buscando novidades, seria melhor voltarmos ao que, embora não seja novo, continua sendo a base.
Na educação existe hoje essa euforia por muitos recursos pedagógicos, muitos materiais, muitos brinquedos (também pedagógicos), muita informação e muito excesso. E onde há excesso é muito difícil que haja também a quietude e o silêncio necessários para o estudo, a concentração e a reflexão.
Em um texto indicado na página Clássica em Casa, ao qual volto sempre que me vejo tentada a correr atrás das últimas informações, o autor, padre Luiz Cláudio Camargo1 relembra as antigas verdades:
Lançar-se à procura de todos os objetos significa que não se vai alcançar nenhum deles. É-se arrastado pelo vento do momento. Em lugar das virtudes que dominam as paixões, têm-se os afetos desordenados, profundamente desordenados. Neste ponto, vê-se que o homem que supostamente se dedica ao saber pela curiosidade, encontra-se em busca de companhia. Vemos em muitos blogs um exemplo dessa necessidade de companhia, de contato, de falar, de se fazer ouvir, de que outro saiba o que se está pensando.
Creio que em meio a toda essa agitação em busca das novidades educativas, faz sentido a constante preocupação das famílias que vivem diante de expectativas astronômicas sobre tudo o que deveriam ser e fazer por seus filhos. E ainda mais agora, com a presença constante das redes sociais. São milhares de informações, opiniões e ideias novas a cada minuto, gerando uma sensação de que estamos muito aquém de tudo o que precisaríamos e de que é preciso fazer mais e mais e mais.
E nos esquecemos que ensinar e educar deveria ser simples.
Quando falo sobre simplicidade não me refiro ao simplismo da mediocridade, mas àquela simplicidade da modéstia, de manter apenas o que é essencial, de se ater ao que importante, aquele “Não andeis ansiosos de coisa alguma…”, que nos leva a observar os as flores no campo e os passarinhos no céu…
Como já disse, certamente educar uma criança é algo trabalhoso e difícil. Mas para a maior parte de nós o problema nunca foi a dificuldade. Afinal a vida tem muitas situações difíceis e não estamos tentando evitar nada disso. O problema é quando a tarefa se torna muito complicada e estressante. Quando parece que não importa o que ou quanto eu faça, sempre estarei me sentindo em falta. Isso é que não é bom.
E foi por isso que eu decidi começar esse projeto novo. Para ajudar nisso: relembrar que a educação caminha junto com a sabedoria, e que a educação e sabedoria caminham junto com a simplicidade.
Educação, sabedoria e simplicidade.
A ideia é, também, simples: oferecer reflexões e sugestões em forma de áudios diários, curtos o bastante para serem ouvidos durante um café =).
O objetivo é tratar de questões envolvendo educação a fim de ajudar especialmente aos pais que gostariam de fazer mais pela educação dos filhos, mas não sabem por onde começar. E àqueles que têm feito muita coisa, mas gostariam de resgatar a simplicidade e investir mais tempo em seu próprio preparo para poder trabalhar a formação intelectual dos filhos e a educação do seu caráter.
Para mais informações é só clicar na imagem abaixo. E que Deus nos ajude a deixar de lado a ansiedade e amar a simplicidade e buscar a paz.
Nota:
- Artigo “Vida intelectual versus vida de curiosidade”, disponível em http://permanencia.org.br/drupal/node/5197
Uma resposta para “Educação, sabedoria e simplicidade”
[…] via Educação, sabedoria e simplicidade — […]
CurtirCurtir